O presente artigo propõe-se a traçar um panorama das pesquisas empíricas, estrangeiras e nacionais, so- bre o processo de determinação da pena pela justiça criminal, o “sentencing”. Apontamos a trajetória des- se campo, suas principais conclusões, bem como os pontos cegos de tais estudos. O objetivo é descrever os caminhos desse conjunto de pesquisas de modo a mostrar como os mesmos nos possibilitam refletir sobre a problemática do padrão de funcionamento desigual da justiça criminal apontado não somente por muitos estudos, mas também pelo imaginário so- cial sobre a justiça criminal. A partir do levantamento da literatura sobre o tema, bem como da análise dos principais trabalhos apontados, propomos uma re- qualificação do problema da disparidade das senten- ças criminais, bem como indicamos um novo objeto a ser explorado e, assim, para novas possibilidades de pesquisa empírica sobre o sentencing.
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